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Desde as primeiras horas de quinta-feira (24.fev), o ataque das forças russas contra a Ucrânia reinou sozinho como principal assunto das redes sociais. Ninguém esperava menos, dada a gravidade do conflito.
Mas, buscando surfar na onda do engajamento que o assunto está rendendo, alguns perfis de alta popularidade, cujo foco passa longe de assuntos de política e relações internacionais, entraram na cobertura da guerra em tempo real, frequentemente publicando informações conflitantes, erros de tradução ou simplesmente se apropriando de conteúdos produzidos por outras pessoas e organizações.
Se, por um lado, essas iniciativas podem alcançar um público que não consome o noticiário mais tradicional e ajudam a conscientizar e informar mais pessoas sobre o conflito, por outro há preocupações sobre a qualidade da informação transmitida, frequentemente encontrada às pressas online e sem qualquer critério de verificação, que está sendo entregue para uma audiência gigantesca.
Na tarde de quinta-feira, a conta do Choquei no Twitter tuitou, em tempo real para seus 1,4 milhão
de seguidores, o discurso do presidente norte-americano Joe Biden sobre o conflito. No Instagram, a mesma conta fez mais de dez posts sobre o tema para seus 16 milhões
de seguidores. Outra conta do nicho de fofocas, a @GossipdoDia dedicou mais de 20 publicações ao tema.
No Twitter, o Choquei muitas vezes não cita fontes de informação em suas publicações e despeja dados e fatos que não têm relação com os acontecimentos, o que pode confundir leitores. (Aparentemente, após críticas, o perfil passou a citar o nome de veículos nos quais baseia seus posts)
No Instagram do Gossip do Dia, a legenda da imagem traz o crédito: "Reprodução/Internet", o que não quer dizer nada.
DÁ LICENÇA, RAFA KALIMANN
A ex-BBB Rafa Kalimann também decidiu usar sua conta no Twitter para trazer informações sobre o conflito. A intenção até pode ter sido boa, mas ela foi alertada por seguidores que não era hora de fazer um "resumo pessoal" sobre a guerra e que seria melhor dar espaço para especialistas e profissionais.
No fim das contas, parece que o conteúdo nem era original dela. Ela aparentemente kibou (copiar ideias e posts dos outros, sem créditos) um outro perfil, de um graduando de História com menos de 4 mil seguidores.
Ao apenas reproduzir conteúdo de fontes online sem citar nenhuma referência, essas contas ficam suscetíveis a cometer erros e a propagar desinformação, mesmo que involuntariamente.
Foi o que aconteceu quando uma publicação do Choquei, que afirmava haver dezenas de milhares de mortos pelas ruas da capital ucraniana Kiev, teve que ser verificada pela Agência Lupa, que a classificou como falsa.
E não foi a única postagem desinformativa. Um tuíte que falava sobre a captura da imagem de Chernobyl pelas forças russas trazia uma foto da antiga usina nuclear tirada em 2014 e uma foto de soldados que circula na internet desde o mesmo ano.
Movimentos como esse também foram vistos fora do Brasil. Uma reportagem do site Input encontrou perfis de Instagram que geralmente focam em memes promovendo outras páginas que supostamente seriam gerenciadas por jornalistas ucranianos. A reportagem descobriu que era uma fraude: as páginas na verdade são operadas por um adolescente nos Estados Unidos que gerencia uma série de outras páginas de conteúdo viral.
ANÁLISES RESPONSÁVEIS
Aproveitando a comoção e interesse em torno do assunto para trazer informação verificada à suas audiências, o apelo desses canais, que muitas vezes cobrem assuntos como celebridades e fofocas, pode ser valioso para que uma cobertura jornalística alcance mais pessoas, especialmente o público mais jovem que não acompanha o noticiário tradicional.
Foi o que fez o streamer Casimiro Miguel, que na madrugada desta quinta-feira convidou para uma live no seu canal do Twitch o professor de política internacional Tanguy Baghdadi.
"Deu merda ou não deu merda?" foi a primeira pergunta feita por Cazé ao professor. A live teve mais de 887 mil
visualizações.
Ter cuidado com a informação é parte da responsabilidade que criadores de conteúdo populares têm com a sua audiência.
No caso específico do conflito entre Rússia e Ucrânia, que é também uma guerra informacional, é ainda mais difícil distinguir o que é informação verdadeira do que é propaganda, por exemplo. A desinformação é estratégia de guerra, escreveu Tai Nalon, CEO da agência de checagem Aos Fatos.
A estratégia de desinformação usada pelos lados no conflito é algo sofisticado, explicou o pesquisador Bernardo Wahl, docente de Segurança Internacional na Fundação Escola de Sociologia e Política de São Paulo (FESPSP) e mestre em relações internacionais ao Desinformante.
"É algo sofisticado porque assim a desinformação não vai aparecer em um vácuo, ela vai aparecer no ambiente onde 80%
das informações são verdadeiras e 20%
são falsas, então a gente acaba dando credibilidade", disse Wahl em entrevista ao site.
Para ajudar a entender melhor o conflito entre Rússia e Ucrânia, o Núcleo preparou uma lista de jornalistas e estudiosos do assunto. Ela será constantemente atualizada para ser inclusiva e diversa.