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Google e OpenAI, as duas empresas à frente da corrida maluca da inteligência artificial, tiraram a semana para anunciar novos poderes que tentam humanizar a tecnologia ao mesmo tempo em que alienam humanos do processo.
Na segunda (13), o CEO da OpenAI, Sam Altman, postou no X apenas a palavra “her” (“ela”, em inglês) após a breve apresentação do GPT-4o (de “omni”), a nova versão do modelo capaz de lidar com imagens e voz em tempo real.
Era uma referência nada sutil ao filme Her (2013), de Spike Jonze, em que um cara solitário se apaixona por um chatbot. A voz do ChatGPT turbinado pelo GPT-4o, fruto da falta de criatividade característica do Vale do Silício, emula a da atriz Scarlett Johansson, que interpreta a assistente virtual Samantha no filme.
Com naturalidade, Samantha e ChatGPT hesitam, fazem piadas, mostram-se úteis. Parece humanas. Elas flertam com o usuário sem jamais se irritarem ou censurá-lo, realizando o sonho molhado do típico “techbro”.
O (ou a?) novo(a) ChatGPT reforça o estereótipo das assistentes virtuais submissas, herança da Siri e Alexa lançadas há mais de uma década, sempre com vozes femininas, ainda que nunca tão sensuais quanto agora.
Graças à recém-adquirida super velocidade de resposta do GPT-4o, a nova funcionalidade da ChatGPT é poder ser interrompida em tempo similar ao que uma pessoa seria por caras mal educados, como bem demonstraram dois engenheiros da OpenAI:
A apresentação do Google, um dia depois da OpenAI, acabou diluída pela da rival menor. Várias novidades do Google são muito parecidas com as da OpenAI, incluindo um novo aplicativo multimodal, chamado Projeto Astra. A única diferença é que ele (ela) não tem uma voz sensual. Por enquanto.
A falta de criatividade do Google é de outra natureza. Pela enésima vez, por exemplo, vimos uma tecnologia que promete fazer reservas em restaurantes em seu lugar. Isso nunca funcionou direito e, a julgar pelas viagens alucinógenas das IAs generativas, duvido que vá funcionar agora.
O Google gastou mais de duas horas fazendo anúncios dos mais variados, tudo envolvendo IA, quase todos desinteressantes. (Talvez eu devesse usar a IA do Google para resumi-la e me poupar do desgaste.)
A parte chocante no show do Google foi o anúncio inesperado da expansão do lero-lero de IA nos resultados do buscador, que a empresa chama de “AI Overviews”, a todos os usuários estadunidenses, com efeito imediato. Até o fim do ano, +1 bilhão de pessoas no mundo inteiro terão respostas geradas pela IA antes dos tradicionais links para outros sites ao pesquisarem algo no Google.
Não é de hoje que o Google tenta “segurar” os usuários em seu domínio, em vez de mandá-los para sites que (supostamente) têm o que as pessoas procuram. Agora, porém, o Google perdeu o pudor. O acordo tácito que existia a empresa e nós, em que cedemos conteúdo em troca de pares de olhos interessados no que publicamos, foi quebrado. O Google quer tudo para ele.
Executivos juram de pés juntos que a IA generativa enviará mais tráfego aos sites. É uma afirmação que desafia a lógica. Previsões independentes, como a do Gartner, estimam quedas generalizadas nos acessos vindos do maior buscador web do mundo. No caso da consultoria, a queda estimada é de 25% até 2026. (Registre-se que desconfio um bocado dessas previsões de consultorias, dado o histórico e os incentivos delas.)
Diante desse cenário, cabe a pergunta: se ninguém acessar diretamente os sites de conteúdo, que incentivo as pessoas que criam o alimento das IAs que as substituem terão para continuar produzindo?
Como que num prêmio de consolação, o Google anunciou um novo filtro na pesquisa, chamado “Web”, que retorna apenas sites de conteúdo, sem redes sociais ou lero-lero de IA. Obrigado…?