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O Ministério da Saúde fez 37 publicações explícitas sobre "tratamento precoce" para Covid-19 em seu perfil no Twitter desde o início da pandemia, e mascarou dezenas de outras publicações com expressões alternativas que remetem a protocolos ineficazes no combate à doença.

A conclusão é baseada em uma análise com dados de posts impulsionados obtidos pela agência Fiquem Sabendo utilizando a Lei de Acesso à Informação, cedidos com antecedência ao Núcleo e também publicados em sua newsletter quinzenal. É possível apoiar a agência neste link.


É importante porque...
  • Ministério da Saúde é a instituição que deveria prezar pelas melhores práticas de saúde na pandemia.
  • CPI da Pandemia investiga promoção de terapias não confirmadas

Análise dos tuítes do gabinete sobre a pandemia que mencionaram a palavra precoce mostrou que o termo tratamento precoce foi o mais frequente, mas outras combinações também eram usadas para sugerir terapias ineficazes no tratamento da Covid.

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As combinações mais utilizadas foram atendimento e identificação, mas outros termos como cuidado, avaliação e detecção também foram encontradas em postagens do MS sobre a doença.

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UMA CONFUSÃO SÓ

Um tweet do Ministério divulgando o lançamento da campanha do Outubro Rosa, em 2020, revela esta confusão. O vídeo da publicação mostra o ex-ministro misturando o diagnóstico precoce do câncer de mama com o da Covid. No tweet, a menção: "O ministro Eduardo Pazuello abordou a importância do tratamento precoce".

O Ministério da Saúde lançou a campanha do #OutubroRosa 2020, em cerimônia com a presença da primeira-dama Michelle Bolsonaro e da ministra @DamaresAlves (@DHumanosBrasil). O ministro Eduardo Pazuello abordou a importância do tratamento precoce. pic.twitter.com/ioNwIPxce3October 7, 2020

Foi também durante o período de Pazuello à frente da pasta, tanto como interino quanto efetivado no cargo, que foram feitas todas as 37 postagens que mencionam explicitamente o protocolo de "tratamento precoce", defendido amplamente pelo governo federal e que consiste em administrar medicamentos (principalmente hidroxicloroquina e ivermectina) para prevenção e tratamento de pacientes de COVID.

Medicamentos têm sua eficácia comprovada mediante exaustivos estudos clínicos, mas até o momento não há evidências de que qualquer remédio funcione preventivamente contra Covid-19. No geral, testes conduzidos com certas drogas foram insuficientes e inconclusivos. No fim de março deste ano, por exemplo, a OMS recomendou que a ivermectina fosse utilizada somente em testes clínicos.

Um desses posts foi o anúncio da efetivação de Pazuello no cargo, em que o Ministério destaca que o general "liderou a nova estratégia de tratamento precoce contra a Covid-19".

Eduardo Pazuello será efetivado como ministro da Saúde amanhã, às 17h. Ele liderou a nova estratégia de tratamento precoce contra a Covid-19, além da distribuição de EPI's, ventiladores e medicamentos para todo o Brasil. https://t.co/CsHjhviwxg pic.twitter.com/Gddw7Y3emiSeptember 15, 2020

Outro tuíte sugeria que pacientes solicitassem o tratamento precoce, recebeu uma marcação do Twitter ligado a "informações enganosas e potencialmente prejudiciais relacionadas à COVID-19".

A gestão de Pazuello, por outro lado, foi a que proporcionalmente menos tuitou sobre COVID dentre os quatro ministros que estiveram à frente da pasta desde o início da pandemia, com ao menos 54,3% dos posts sobre o assunto. Esse resultado é puxado principalmente pelo período entre setembro e dezembro de 2020, quando outros assuntos estiveram mais em pauta no Twitter do Ministério.

Balanço

Em média, a conta oficial do MS publicou mais tuítes -- uma média de 15 por dia -- durante a gestão de Luiz Henrique Mandetta, o primeiro ministro e que permaneceu no cargo até 16 de abril. A menor quantidade de tuítes por dia foi feita durante o tempo de Nelson Teich a frente do MS -- média de 8,3 tuítes por dia. Por outro lado, foi durante a gestão de Teich que proporcionalmente foram feitas mais publicações falando sobre COVID, com 76% dos tuítes fazendo alguma menção ao vírus.

A quantidade de posts fazendo alguma menção à COVID representa ao menos 58,8% do total de tuítes publicados em todo o período.

930 posts faziam alguma menção ao termo "vacina", sendo que 646 tuítes falavam especificamente de vacinas contra o coronavírus.

O Fiquem Sabendo também identificou 85 posts promovidos pela pasta -- publicações artificialmente impulsionadas pelo Twitter -- dos quais apenas um era sobre a campanha de vacinação contra a COVID-19. Além deste tuíte promovido, foram impulsionados outros 34 posts sobre campanhas de vacinação contra outras doenças.

Como fizemos isso

Para contabilizar o número de tweets por gestão no Ministério, dividimos o período da pandemia pelo tempo de cada ministro à frente da Saúde, considerando a data de demissão de cada ministro como término de um período, e o dia subsequente como início da gestão seguinte.

Para identificar menções à COVID, utilizamos as seguintes palavras-chave: covid, coronavirus, pandemia, novocoronavirus, respiradores, sars-cov2, coronavac, sinovac, astrazeneca, pfizer, butantan, ifa , segunda dose , mascara, ventilador, entrada de estrangeiro, eficacia, oxford -- além de uma combinação de classificação manual e por palavras-chave de tweets que mencionavam vacina.

As publicações sobre a vacinação contra o coronavírus foram todas a que mencionavam vacina e não atendiam aos seguintes critérios:

  • Tweets até 31/07/2020, pois as vacinas contra covid eram tema pouco abordado, e o foco era em outras campanhas;
  • Tweets com as seguintes palavras-chave: gripe, influenza, sarampo, informatizacaosus, conectesus, todas as idades, curso, poliomelite, 15 anos, caes e gatos, crianca, diad, dia d, paralisia infantil, tetano, rubeola, caderneta de vacinacao, novembroazul, adolescente, adolescencia, cartao de vacina, golpe, celular.

Existe a possibilidade de falsos negativos (tweets marcados como não mencionando a covid, quando se referiam a ela). Contudo, é improvável que eles afetem a comparação entre gestões: é necessário que existam 326 publicações falso-negativas dentre as publicações da gestão Pazuello para que ele alcance o patamar da gestão Queiroga (64,9%) em menções a Covid (considerando que não existam falsos negativos entre esta última). Ou seja, isto implicaria em um erro de classificação de 23% dos tweets categorizados como não-covid nesta gestão.

Reportagem Lucas Gelape e Laís Martins
Edição Sérgio Spagnuolo
dados: Tabela do Fiquem Sabendo
dados: Tabela do Núcleo
Twitter/XFiquem Sabendo
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