Um monitoramento das redes Gettr, Facebook e Twitter durante a primeira quinzena de julho revela que a maioria das publicações com o termo “petista” refere-se à tentativa de associar o Partido dos Trabalhadores (PT) à violência e atos criminosos. Posts com o termo “violência”, em sua maioria, também falam sobre o PT, o ex-presidente petista Luiz Inácio Lula da Silva e a esquerda.
Para as autoras do levantamento, referente ao período entre os dias 4 e 19 de julho, a análise dos dados revela um aumento de temas sobre violência política nas redes contra a esquerda e o aumento da criminalização do PT nos últimos dias.
A pesquisa foi feita por Andressa Liegi, do Centro de Administração e Políticas Públicas (CAPP/ISCSP), e Tatiana Dourado, do Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia em Democracia Digital e da Universidade Federal da Bahia (UFBA). Ambas fazem monitoramento contínuo de redes sociais.
Durante o período de análise ocorreu o assassinato do guarda municipal Marcelo Arruda, em Foz do Iguaçu (PR), no dia 9 de julho.
Dois dias antes de o petista ser morto pelo apoiador de Jair Bolsonaro (PL), o presidente afirmou, em sua live semanal: "Não preciso dizer o que estou pensando, você sabe o que está em jogo, e você sabe como deve se preparar (...) sabemos o que temos que fazer antes das eleições".
Sobre o caso Arruda
Arruda comemorava seu aniversário com uma festa temática em homenagem ao PT e ao ex-presidente Lula quando o policial penal bolsonarista Jorge José da Rocha Guaranho atirou contra Arruda gritando, segundo testemunhas, “aqui é Bolsonaro” e "petista vai morrer tudo".
“Pelo menos desde 2018 está mais demarcado socialmente que a ojeriza ao PT e à esquerda representa também a construção da ideia de ameaça do comunismo e de valores opostos aos costumes do conservadorismo", diz Liegi, que é doutoranda em Ciência Política no Instituto Superior de Ciências Sociais e Políticas da Universidade de Lisboa.
"A maior proximidade das eleições tem feito com que críticas baseadas em linguagem odiosa contra Lula e PT voltem a ocupar lugar de destaque nas redes da direita radical e extremista"
- Andressa Liegi, do Centro de Administração e Políticas Públicas (CAPP/ISCSP)
Já Dourado explica que as pesquisadoras notaram o avanço de temas que associam Lula, PT ou campo de esquerda à violência política e à facção criminosa PCC em seus monitoramentos a partir de 1º.jul.22.
Esses assuntos ultrapassaram, em volume, as publicações sobre ataques ao Supremo Tribunal Federal (STF), que costumavam ser a maioria nos levantamentos.
Vale lembrar como as coisas são quando o atacado é Bolsonaro
— Eduardo Bolsonaro🇧🇷 (@BolsonaroSP) July 18, 2022
E falar de PT e PCC não é agir igual ao gado esquerdista, é reportar-se a uma delação de Marcos Valério pra PF e homologada pelo STF!
Associar Bolsonaro a Hitler, p.ex., é uma ilação sem qualquer base em fatos pic.twitter.com/hg4FlN1cps
VIOLÊNCIA CONCRETA
No dia primeiro, a revista Veja publicou em seu site "trechos inéditos da delação premiada que o publicitário Marcos Valério fechou com a Polícia Federal".
A homologação dessa delação, no entanto, ocorreu em setembro de 2018. No depoimento, Valério afirma, segundo a Veja, que ouviu do então secretário-geral do PT, Sílvio Pereira, detalhes sobre o que seria a relação entre petistas e o PCC.
“Notamos, nos últimos dias, um grande número de publicações que tentam explorar o sentimento antipetista com o imaginário em torno da violência. E, no mês de junho, tivemos episódios de violência concreta, como o drone que lançou fezes em apoiadores petistas em Minas, no começo de julho, houve a bomba caseira em ato de Lula no Rio”, diz Dourado.
Liegi explica, ainda, que as redes apoiadoras do presidente Jair Bolsonaro (PL) exercem uma função de associar a esquerda/Lula/PT a um componente moral, como se representassem “o mal” de forma mais simbólica, enquanto tentam distanciar o presidente de atos violentos e vitimizá-lo.
“Há uma construção narrativa que visa dissociar Bolsonaro da violência ou, ainda, colocá-lo como alvo da violência e relacioná-la à esquerda, a partir de episódios passados ou recentes, alguns utilizando-se de fake news ou informações distorcidas, além de explorar a relação com o PCC,” afirma a pesquisadora.
Na semana passada, o ministro Alexandre de Moraes, presidente em exercício do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), determinou que políticos de extrema-direita, veículos de comunicação de direita e canais de YouTube excluíssem conteúdos falsos que associassem Lula e o PT com a facção criminosa.

Gettr
No Gettr, cópia do Twitter criada por um conselheiro do ex-presidente Donald Trump e uma esperança da extrema-direita para depender menos de redes sociais como Twitter e Facebook, o perfil que mais publicou o termo petista é o Gettr Brasil Oficial. Análise do Núcleo aponta que o @gettrbrasilofc é o perfil com mais posts em português na rede.
Um dos primeiros posts no Gettr com a associação entre o PT e o PCC foi do deputado federal Eduardo Bolsonaro (PL-SP), que está entre os cinco perfis que mais postaram sobre violência. Já a conta que mais publicou o termo violência foi a do influenciador bolsonarista Leandro Ruschel.

No Twitter, a postagem de destaque também é de Ruschel:
Fiquei confuso. Qual dessas notícias é proibido postar, afinal?
— Leandro Ruschel 🇧🇷🇺🇸🇮🇹🇩🇪 (@leandroruschel) July 18, 2022
1) Marcos Valério afirmou que PCC financiava o PT;
2) Ex-contador de Lula investigado por lavagem de dinheiro do PCC;
3) Vereador petista investigado por ligação com o PCC;
4) Diálogo "cabuloso" com o PCC.
Publicação do ex-ministro Ricardo Salles tentando dissociar Bolsonaro de atos violentos e culpanto e petistas também apareceu no monitoramento:
As narrativas esquerdopatas não se sustentam: dias atrás, o molusco enalteceu o agressor petista em Diadema. Ontem, JB condenou a agressão do bolsonarista no Paraná.
— Ricardo Salles (@rsallesmma) July 11, 2022
O vereador Carlos Bolsonaro (PL-RJ) também postou sobre a associação entre PT e PCC usando de uma estratégia comum entre bolsonaristas.
"Muitos perfis usam conteúdo de terceiros para legitimar a incitação à violência, como uso de prints antigos, notícias antigas ou ainda desvirtuando falas de atores políticos", explica Dourado.
É só um cara do PSOL falando https://t.co/15pg7ZpUe2
— Carlos Bolsonaro (@CarlosBolsonaro) July 19, 2022
No Facebook, as principais postagens sobre os temas foram da deputada federal Carla Zambelli (PL-SP) e da Jovem Pan.


COMO FIZEMOS ISSO
O Núcleo utilizou o relatório do monitoramento das pesquisadoras Andressa Liegi, do Centro de Administração e Políticas Públicas (CAPP/ISCSP), e Tatiana Dourado, do Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia em Democracia Digital e da Universidade Federal da Bahia (UFBA). Ambas fazem monitoramento contínuo de redes sociais.
O Núcleo faz seu próprio monitoramento dessas redes sociais e fornece dados que podem ter sido usados nesse relatório.
Optamos por incluir os posts originais dos perfis citados por entender que não é esta reportagem que vai angariar mais atenção para eles, que já possuem muitos seguidores. Isso torna fácil que outros profissionais acompanhem e monitorem esses perfis.