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Reportagem Paula Bianchi, Matheus Santino, Natalia Viana
Essa reportagem foi originalmente publicada pela Agência Pública e faz parte do Sentinela Eleitoral, projeto que investiga e analisa as redes de manipulação do debate público (fake news) nas eleições em parceria com o Berkman Klein Center for Internet & Society da Universidade de Harvard.
Enquanto parte da tradicional família brasileira trocava o feriado de sol pela manifestação promovida pelo presidente Jair Bolsonaro na orla da praia de Copacabana, a rede social Gettr, fundada pelo ex-porta-voz de Donald Trump, aproveitava para angariar novos membros. Apesar de seu criador Jason Miller afirmar que a rede não tem relação com política nem apoia Bolsonaro, a rede decidiu trocar neste feriado a cor da sua identidade do vermelho pelo verde e escolheu o Posto 3, próximo ao palanque de Bolsonaro patrocinado pelo pastor Silas Malafaia — indicando em quem a empresa está apostando.
“Não tomamos partido. A Gettr é para todos. Nós defendemos o livre discurso, a volta da diversão no uso das redes sociais e adoramos o Brasil, nosso segundo maior mercado. Estamos aqui porque é um dia importante para o país, mas queremos voltar durante a Copa e o Carnaval”, disse Miller à Agência Pública, enquanto conversava com pessoas que deixavam o ato em prol de Bolsonaro ao lado de um tótem inflável com os dizeres “Gettr – Chegou a hora de dizer o que pensa do jeito que quer!”. Em 2021, Jason Miller foi questionado pela PF no aeroporto de Brasília, também no dia 7 de setembro.
Porém, como em ações de marketing anteriores da rede social, não havia uma divisão clara entre a propaganda da rede social e o apoio explícito à candidatura de Jair Bolsonaro e outros candidatos do campo bolsonarista. Questionado sobre sua relação com o presidente e em especial com seu filho, Eduardo Bolsonaro — que já teve eventos de seu think tank Instituto Conservador Liberal (ICL) patrocinados pela Gettr —, Miller disse que já o conheceu, mas que não teria nenhuma reunião com políticos em sua passagem pelo Brasil. “A Gettr não é política, é sobre liberdade de discurso, apesar de muitos políticos a utilizarem”, afirmou.
A empresa também fez uma cobertura ao vivo dos atos desta quarta, promoveu tweets de influenciadores bolsonaristas e colocou uma equipe na rua para tentar convencer apoiadores do presidente a abrirem contas na rede. Quem baixava o aplicativo da Gettr ganhava uma camiseta. Ao todo, a ação conseguiu 400 novos membros, segundo os organizadores. A empresa não informou o valor investido na ação.
Um dos novos usuários foi o servidor público Jadir Silva, de 54 anos, que se descreve como um apoiador de Bolsonaro. “Eu vim de curioso, pela camiseta. Vou abrir e ver, mas não sei se vou usar”, disse. Ao seu lado, o empresário Pedro Martins, de 72 anos, recebia ajuda de uma atendente para baixar o aplicativo da rede em seu celular, enquanto explicava que já a conhecia. “Baixei a primeira vez depois da sacanagem que fizeram ao barrar ele no aeroporto, mas tive um problema no telefone e perdi. Meus filhos que usam bastante”.
Durante todo o dia, o perfil oficial da Gettr Brasil repostou fotos e vídeos de apoiadores e políticos alinhados ao governo, como Carla Zambelli, Flávio Bolsonaro e Diogo Forjaz. Pela manhã, a conta fez uma live com a transmissão da TV Brasil do desfile em Brasília.
Usando um tom intimista, a conta oficial incentivou que os usuários mandassem fotos e vídeos das manifestações, usando as hashtags #bicentenariobrasil e #bicentenariodaindependencia. Em um dos posts, o perfil disse “Tá lindo demais meus amigs!! Milhões de brasileiros patriotas nas ruas passando na sua timeline!! Não tem coração verde e amarelo que aguente!!🇧🇷”. O vídeo mais curtido postado pela própria página mostra uma visão aérea do evento no Rio de Janeiro com os dizeres “Copacabana: surreal”.
Além de interagir com os eleitores do presidente, o perfil oficial do Gettr BR repostou mensagens de influenciadoras trumpistas que parabenizaram o Brasil pelos 200 anos de independência e pelas manifestações. Uma das influenciadoras, Lara8, que conta com a hashtag “maga” em seu perfil, conta com mais de 62 mil seguidores.
A Agência Pública já revelou que o Gettr patrocinou congressos e eventos que funcionaram como pré-campanha de Bolsonaro. Segundo especialistas ouvidos, esses patrocínios podem ferir a lei eleitoral.
Jason Miller faz selfies e promove candidatos a deputado
Jason Miller, CEO da Gettr, esteve no Brasil para o 7 de Setembro e usou suas redes para festejar as manifestações pró-independência. Desde as 11h da manhã, ele já postava comentários em expectativa à manifestação pró-Bolsonaro em Copacabana. Às 9:36, ele tuitou: “O pessoal está começando a aparecer… Esperem até ver [a avenida] Atlântica em algumas horas!!”. Recebeu 170 likes. No Gettr, ele postou duas horas depois, animado: “Está enchendo!”
A vinda do CEO da Gettr havia sido anunciada em um release compartilhado por ele mesmo e pela conta oficial do Gettr. No twitter, Jason Miller anunciou animadamente “We’re back!!! 🇧🇷💪🇧🇷💪”. Teve 550 likes.
Eduardo Bittar, venezuelano que é “conselheiro sênior” do Gettr, chamou os usuários às 11:18 da manhã para acompanharem na rede, usando o slogan da campanha de Bolsonaro: “Sigam hoje o #BicentenarioBrasil 🇧🇷através de @GettrBrasilofc. – BRASIL ACIMA DE TUDO, DEUS ACIMA DE TODOS.”
Em outro post, Bittar também afirmou que “ele vai ganhar de novo” e desafiou Lula a levar o mesmo número de gente para as ruas “Busquem Lula fazendo isso e me avisem, divulgadores de Fake News” — ele se referia às pesquisas eleitorais que dão vitória a Lula. “Para cima, Bolsonaro”.
Jason Miller também postou várias selfies com usuários da sua rede social e apoiadores de Bolsonaro. Em um deles, celebrou um casal que tinha contas do Gettr “desde o começo” e “até viram minha entrevista com a Ana Paula Henkel no ano passado”. Ana Paula também tem conta no Gettr, onde é uma das maiores influenciadoras com mais de 250 mil seguidores.
Às 13:38, Jason Miller postou um vídeo com o totem inflável do Gettr em Copacabana, cercado de pessoas. “Muito amor pelo #GETTR hoje! #BicentenarioBrasil”.
“Outro usuário feliz do Gettr”, escreveu, sobre outra selfie postada às 16:26. (acima). Em várias fotos, ele celebrava ter convencido novos usuários a se juntarem ao Gettr.
Por volta das 14h, conforme narrou pela sua conta no Gettr, ele recebeu uma mensagem de sua equipe chamando para subir em um carro de som. Ele conseguiu chegar e falar por volta das 15h. “Ali em cima, a vista era incrível, pessoas por toda parte”, escreveu. Miller falou sobre a prisão em 2021 e finalizou com a mensagem: “As pessoas da América estão com as pessoas do Brasil no seu bicentenário… e nós seremos amigos por mais duzentos anos”.
Pouco antes, já de cima do trio elétrico, ele tirou uma selfie com o deputado estadual e candidato à reeleição, Fábio Silva, do Partido Trabalhista Cristão, atualmente no seu quinto mandato e buscando mais uma reeleição. “Muito bom conhecer o deputado estadual e sua equipe (…) Todo mundo estou celebrando”, escreveu. Além dele, o CEO do Gettr também promoveu a candidata a deputada estadual Carol Cavalcante pelo Progressista (PP), que, segundo ele, entrou hoje no Gettr.
É a segunda vez que Jason vem ao Brasil apenas este ano. Em março ele esteve no CPAC, congresso conversador organizado pelo Instituto Conservador Liberal (ICL), de Eduardo Bolsonaro. Na ocasião, Miller falou sobre a importância do momento político “não só no Brasil mas no mundo”. Depois, Bolsonaro falou por vídeo chamada. Ele voltou a levantar suspeitas sobre as urnas eletrônicas e a atacar ministros do Supremo Tribunal Federal (STF). A Gettr foi patrocinadora oficial do CPAC, mas negou-se a dizer qual o valor investido no evento.
Já no final da tarde, Jason postou, animado, de cima do carro de som: “estou no topo do mundo”, escreveu. Questionado pela Pública, ela não afirmou o valor investido na ação, mas afirmou que pretende fazer novas ações de marketing durante a Copa do Mundo e o Carnaval.
Este conteúdo faz parte do Sentinela Eleitoral, projeto da Agência Pública que investiga e analisa as redes de manipulação do debate público (fake news) nas eleições em parceria com o Berkman Klein Center for Internet & Society da Universidade de Harvard. https://apublica.org/sentinela/