O microbioma do ar é composto principalmente de bactérias e fungos que ficam suspensos quando são expelidos da superfície. Só uma pequena parte desse pessoal volta aqui para baixo em gotículas de chuva ou pegando carona em partículas como grãos de areia ou poeira.
Um grupo de cientistas resolveu olhar melhor para as pequenas formas de vida que habitam cada altitude. Para coletar amostras, usaram uma torre meteorológica de 200 metros e uma aeronave de pesquisa que sobrevoou diferentes alturas, junto com uma bomba de sucção.

A tarefa não é tão fácil, como me contou a bióloga molecular Ana Carolina Junqueira, professora da UFRJ e uma das autoras do estudo internacional. "A atmosfera representa a última fronteira em que o microbioma tem sido estudado, devido às dificuldades de coleta, pela baixa biomassa, e da extração de DNA."
Ela participou do trabalho de analisar o DNA das amostras, que já trouxe alguns resultados sobre a dinâmica deste microbioma.
"Revelamos que o único fator significativamente associado a mudanças do microbioma no ar é a temperatura e, provavelmente, a composição deste microbioma será alterada com o aquecimento global", explicou, deixando o alerta: "isso poderá afetar a produção agrícola e a saúde humana e animal".
Uma descoberta curiosa feita no mesmo estudo foi a quantidade maior de bactérias tolerantes à radiação encontrada nos estratos mais altos. "Isso contribui para a discussão teórica sobre o ar como um ambiente habitado, e não apenas um meio de transporte".
O estudo da diversidade ambiental de microrganismos é uma área que tem crescido em importância. Veja, a seguir, outros exemplos.
Cidades invisíveis
Conhecemos pouco sobre os microrganismos que circulam nas cidades. Uma iniciativa global vai ajudar a trazer mais dados, criando o Atlas Microbiano de Cidades.
"Aqui no Rio vamos iniciar um projeto colaborativo para fazer swab em locais com alta circulação de pessoas, verificando a circulação de patógenos e microrganismos com resistência, também para entender o microbioma urbano residente, importante para o tratamento de resíduos, biodegradação de poluentes e fixação de nitrogênio", conta Ana Carolina.
Um trabalho com amostras de cerca de 60 cidades mostrou que cada uma tem uma espécie de assinatura microbiana própria. Mas existem diferenças até mesmo entre bairros! Será que o cheirinho característico de alguns locais como o metrô tem alguma coisa a ver com isso? O assunto foi discutido no Reddit.
Cities have their own distinct microbial fingerprints from TrueReddit
O mar sob o microscópio
Grupos que estudam o microbioma de sistemas marinhos têm avançado bastante no tema ambiental, inclusive propondo o uso de probióticos para evitar o branqueamento de corais, um fenômeno que traz impactos ecossistêmicos gigantes.
Estudos recentes têm mostrado o potencial uso de microrganismos para amenizar os efeitos do branqueamento dos corais. Já foi demonstrado que o uso de um consórcio microbiano pode, por exemplo, mitigar desordens causadas pela exposição a temperaturas mais altas. pic.twitter.com/rZKecLDtDD
— Ferreira Lab - Cocos Patogênicos e Microbiota (@LabCocos) September 15, 2021
Lembra do plâncton? Longe de ser um vilão de desenho animado, o fitoplâncton simplesmente ajuda a produzir o oxigênio que respiramos.
Assim como as diatomáceas, existem diversos outros organismos do fitoplâncton que produzem nosso oxigênio. Por não precisar se fixar, criar raízes, galhos e folhas, o fitoplâncton consome menos oxigênio do que produz. Sobrando mais pro resto do planeta consumir pic.twitter.com/tJSGFi1EYb
— Adriana Lippi #MarcoTemporalNão (@drilippi) July 5, 2021
Como contei no vídeo a seguir, um veleiro científico segue com a missão de entender como o microplástico afeta o microbioma marinho, inclusive o fitoplâncton. A comunidade de bactérias que se forma em volta do plástico pode desequilibrar a vida no mar, e já tem até nome: plastisfera.
Ameaça no esgoto
Eu nem posso imaginar que bicho esquisito deve compor o microbioma dos esgotos. Não por acaso, quem é batizado nessa água pode ir parar o hospital, mesmo que preventivamente. Como os funcionários da obra do metrô de São Paulo, atingidos por esgoto no acidente recente.
Funcionários desesperados na obra da linha 6 laranja do Metrô com os colegas que ainda estavam no poço e a sopa de merda só aumentava 😱 pic.twitter.com/HSRuzB3RBe
— São Paulo Sobre Trilhos 🚈 (@SPSobreTrilhos) February 1, 2022
Por isso mesmo, o esgoto é material farto para a ciência. Uma das coisas que os pesquisadores têm investigado nele é a circulação de bactérias resistentes a antimicrobianos.
Dá até para monitorar a pandemia analisando a presença de traços do Sars-Cov-2 nos efluentes.
Carga de Sars-CoV-2 no esgoto de Curitiba atinge, na última semana de 2021, maior quantidade desde agosto https://t.co/mIpRR8AQul pic.twitter.com/XLYaBuiuAh
— UFPR (@UFPR) January 5, 2022
Alguns argumentam que é o método mais confiável para medir o crescimento de casos num determinado período, porque dá para separar de vieses como aumento da testagem das pessoas.
O gelo (imundo) do pescado
Para encerrar, este trabalho divulgado no Twitter pela Izabela Cristina mostrou como é importante monitorar microrganismos não só nos alimentos, mas no ambiente em que eles são mantidos. Seria mais saudável que o gelo do pescado não contivesse umas bactérias NERVOSAS e até larvas, né?
E o alto nível de proliferação de bactérias mesófilas e psicrotróficas pic.twitter.com/QZUXARyvJ1
— Biodiversidade em Foco | Gustavo Shintate (@BiodivFoco) January 15, 2022