Relatório de transição propõe que governo monitore extremismo nas redes

Grupo de transição de Lula sugere que órgãos de inteligência se comuniquem com escolas para evitar atentados
Relatório de transição propõe que governo monitore extremismo nas redes
Arte: Rodolfo Almeida
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Um relatório elaborado pelo grupo de transição do presidente-eleito Lula na área de Educação, divulgado nesta quarta-feira (14.dez), propõe que órgãos de inteligência brasileiros monitorem canais e células de extrema-direita nas redes sociais como uma das formas de prevenir atentados em escolas.

Esse é um raro caso em que extremismo online é pauta de destaque para um futuro Ministério da Educação.

É notório também o destaque do relatório para que a agências de inteligência atuem em casos do tipo, o que exigiria coordenação do ministério com Presidência, Justiça e secretarias de segurança estaduais.

"A inserção nas escolas de artefatos de segurança, tais como catracas e seguranças armados, não vai enfrentar o impacto do extremismo de direita nos jovens e, pelo contrário, tende a aumentar as ameaças, bem como ocasionar riscos de novos atentados", diz o relatório (pág.5, item 17).

É fundamental, portanto, que órgãos de inteligência ligados às forças de segurança monitorem sites, plataformas e fóruns anônimos, ao passo que mantenham canal de comunicação direto com as escolas.

- Relatório de grupo de transição "O extremismo de direita entre adolescentes e jovens no Brasil: ataques às escolas e alternativas para a ação governamental"

Em conversa com o Núcleo, Letícia Oliveira, co-autora do documento, afirmou que o relatório será atualizado ao longo do tempo e “serve para gerar a discussão na criação e implementação de políticas públicas”.

Autoria

O relatório foi organizado por Daniel Cara, professor da Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo (USP), em colaboração com 12 pesquisadoras: Andressa Pellanda, Catarina de Almeida Santos, Claudia Maria Dadico, Fernanda Rasi Madi, Fernanda Orsati, Juliana Meato, Letícia Oliveira, Lola Aronovich, Luka Franca, Marcele Frossard e Paola da Costa Silveira. 

Cooptação pelas redes

Ao todo, indica o relatório, são citadas sete táticas usadas pela extrema-direita para cooptar jovens nas redes e incentivar atentados:

  • Pelo uso de humor, com compartilhamento de memes que relativizam violências ou dessensibilizam certos grupos e etnias;
  • Trollagem a partir de posts visando confundir e criar discussões com grupos políticos de esquerda;
  • Uso de linguagens e estéticas misóginas que “representam as regras universais” do ecossistema;
  • Socialização e cooptação em plataformas de jogos online;
  • Compartilhamento de imagens de vítimas e manifestos de atiradores como forma de incentivo e propaganda;
  • Competição e incentivo para conseguir atenção midiática após atos extremistas.
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Cultura gamer

Além das redes sociais, jogos online, como Fortnite, Minecraft e Roblox, também são usados como uma ferramenta de recrutamento de jovens, por serem um espaço para “diversão, vazão de sentimentos de raiva e frustração e construção de vínculos sociais”.

Esse fenômeno já foi abordado pelo Tech Against Terrorism, grupo de pesquisa apoiado pelas Nações Unidas. Em 2021, a TAT denunciou que extremistas estariam usando o Roblox para criar versões jogáveis ​​de atentados reais da extrema-direita.

As pesquisadoras afirmam que esses jogos não têm registros permanentes dos diálogos entre jogadores, dificultando a identificação dos usuários de extrema-direita.

Contudo, Roblox, Fortnite e Minecraft armazenam registros das partidas, conforme as políticas de comunidade dos jogos. Esses registros incluem mensagens e interações.

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Algoritmo do YouTube

Para as especialistas, a cultura de jogos online também incentiva jovens a procurarem e consumirem conteúdos radicalizados nas redes sociais, como o YouTube.

O documento afirma que pela “falta de acompanhamento dos responsáveis” e de educação midiática, os jovens não conseguiriam refletir “de forma crítica” o conteúdo acessado. Por isso, cairiam em um abismo de conteúdo de extrema-direita a partir do algoritmo de recomendação.

Saiba mais

A relação entre o algoritmo do YouTube e a amplificação de conteúdo de extrema-direita é há tempos alvo de diversos estudos e análises, com diferentes hipóteses.

  • Um estudo da Universidade de Stanford, EUA, publicado em 2021, defende que o consumo de conteúdo extremista no YouTube é uma combinação de fatores, como preferências do usuário, recursos da plataforma e uma dinâmica de oferta e demanda envolvendo notícias sobre política;
  • Já o estudo mais recente, publicado por pesquisadores da Universidade de Nova York em 2022, afirma que o algoritmo do YouTube não impulsiona a maioria dos usuários a abismos de conteúdo extremista. Contudo, cria bolhas ideológicas e “tende a ir para um conteúdo moderadamente conservador”.
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Órgãos de inteligência

O documento sugere a amplificação do sistema de órgãos de inteligência para monitoramento da atividade da extrema-direita brasileira na internet.

O relatório defende que agentes de inteligência devam receber treinamento técnico atualizado “para acompanhar no mesmo ritmo a rápida evolução dos modos e meios de recrutamento de crianças e adolescentes”, assim como uso de símbolos extremistas.

"É importante que as agências de investigação nacionais também desenvolvam um programa permanente de monitoramento e formação de seus agentes, com dedicação exclusiva a esse tipo de ocorrência, para que ações de inteligência desenvolvidas no Brasil também tenham maior eficiência", diz o relatório.

COMO FIZEMOS ISSO

O texto foi baseado no relatório "O extremismo de direita entre adolescentes e jovens no Brasil: ataques às escolas e alternativas para a ação governamental", produzido por pesquisadores brasileiros em dez.2022.

Reportagem Sofia Schurig
Arte Rodolfo Almeida
Edição Sérgio Spagnuolo

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