As novas resoluções aprovadas, nesta semana, pelo TSE para as eleições municipais de 2024 incluem uma "bomba" contra redes sociais, abrindo a possibilidade de responsabilização dessas empresas caso não removam "imediatamente" conteúdo antidemocrático, mesmo sem notificação judicial ou provocação.
Segundo o novo texto do artigo 9-E, publicado na noite de sexta-feira (1.mar.2024) em edição extra do Diário Oficial de Justiça (pág. 135), "os provedores de aplicação serão solidariamente responsáveis, civil e administrativamente, quando não promoverem a indisponibilização imediata de conteúdos e contas, durante o período eleitoral, nos seguintes casos de risco."
O Núcleo consultou neste sábado (2.mar.2024) dois especialistas em direito eleitoral, que afirmaram haver, por conta da falta de especificidade do texto, alta possibilidade dessa regra forçar plataformas a bloquearem conteúdos de maneira pró-ativa e até indiscriminadamente.
"O TSE acaba de catar um míssil e jogar nas plataformas", disse um especialista independente que prefere não se identificar. "Parte-se do pressuposto que elas vão ativamente monitorar tudo... as empresas estão chocadas."
O texto, inclusive pelo uso do termo "imediata", deixa em aberto a interpretação de que não há necessidade de notificação judicial ou de qualquer outra provocação para alertar as plataformas sobre tais conteúdos.
Isso abre possibilidades para que as redes criem mecanismos que levariam a remoções também de publicações legítimas – trazendo consequências, inclusive, para liberdade de expressão.
"A nova regra do TSE aparentemente impõe um dever de vigilância praticamente inexequível para as plataformas", disse ao Núcleo o advogado Rafael Morgental, especializado em direito eleitoral, membro da Academia Brasileira de Direito Eleitoral e Político (Abradep) e ex-chefe de gabinete da presidência do TRE-RS por 11 anos.
"Talvez nem as Big Techs tenham condições de fazer essa fiscalização exigida a elas."
Embora haja consenso de que as plataformas precisem agir contra conteúdos criminosos e anti-democráticos, a janela de interpretações aberta por essa norma pode levar a muitos questionamentos sobre a possibilidade de execução por essas empresas, e, consequentemente a contestações na Justiça.
Nós estamos caminhando para um cenário de risco e muita judicialização
– Rafael Morgental, membro da Abradep
O Núcleo entrou em contato neste sábado pela manhã com Google/YouTube, Meta, TikTok e TSE, mas não obteve resposta até o fechamento da reportagem.
"Art. 9º-E. Os provedores de aplicação serão solidariamente responsáveis, civil e administrativamente, quando não promoverem a indisponibilização imediata de conteúdos e contas, durante o período eleitoral, nos seguintes casos de risco:
I - de condutas, informações e atos antidemocráticos caracterizadores de violação aos artigos 296, parágrafo único; 359-L, 359- M, 359-N, 359-P e 359-R do Código Penal;
II - de divulgação ou compartilhamento de fatos notoriamente inverídicos ou gravemente descontextualizados que atinjam a integridade do processo eleitoral, inclusive os processos de votação, apuração e totalização de votos;
III - de grave ameaça, direta e imediata, de violência ou incitação à violência contra a integridade física de membros e servidores da Justiça eleitoral e Ministério Público eleitoral ou contra a infraestrutura física do Poder Judiciário para restringir ou impedir o exercício dos poderes constitucionais ou a abolição violenta do Estado Democrático de Direito;
IV - de comportamento ou discurso de ódio, inclusive promoção de racismo, homofobia, ideologias nazistas, fascistas ou odiosas contra uma pessoa ou grupo por preconceito de origem, raça, sexo, cor, idade, religião e quaisquer outras formas de discriminação;
V - de divulgação ou compartilhamento de conteúdo fabricado ou manipulado, parcial ou integralmente, por tecnologias digitais, incluindo inteligência artificial, em desacordo com as formas de rotulagem trazidas na presente Resolução."
Fonte: DJE-TSE - 4.mar.2023, págs. 135 e 136
Referência: Resolução 23.610 do TSE (atualizada)