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A resolução aprovada por unanimidade pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE), nesta quinta-feira (20.out), abre margem para que a Justiça Eleitoral determine o bloqueio temporário da operação de plataformas no Brasil durante o período eleitoral no caso de descumprimento reiterado de decisões.
O Núcleo consultou a avaliação de especialistas e pesquisadores de organizações da sociedade civil.
Em seu artigo 5º, a resolução do TSE prevê que:
"Havendo descumprimento reiterado de determinações baseadas nesta Resolução, o Presidente do Tribunal Superior Eleitoral poderá determinar a suspensão do acesso aos serviços da plataforma implicada, em número de horas proporcional à gravidade da infração, observado o limite máximo de vinte e quatro horas".
Esse prazo de 24 horas poderá ser duplicado a cada descumprimento subsequente. Não fica claro no texto o que configura descumprimento reiterado e nem o que significa "proporcional".
Na prática, isso significa que poderia haver um bloqueio ao acesso à plataforma em território nacional, como o que quase ocorreu com o Telegram em mar.2022 após seguidos descumprimentos de decisões judiciais.
Uma interpretação possível é que resolução seja um instrumento de pressão que o TSE encontrou para forçar uma ação mais célere e efetiva das plataformas.
É importante lembrar que até então o único compromisso entre o tribunal e as plataformas se dava no âmbito dos memorandos de entendimento, que, embora estabeleçam ações a serem implementadas, não preveem punições caso não sejam.
Precedente vs salvaguardas
Mas a resolução traz implicações e cria precedentes para temas importantes como liberdade de expressão.
"São riscos à liberdade de expressão e ao debate público, porque não é a remoção de um conteúdo ou do conteúdo ilegal. Ou você remove uma conta e impede que ela fale ou você derruba uma aplicação inteira, que tem diversos outros usos, que não só usos políticos, eleitorais", disse Heloisa Massaro, diretora do InternetLab. "Vai depender um pouco da interpretação do tribunal".
Especialistas apontam que o tribunal colocou salvaguardas importantes na resolução, com potencial de frear, ao menos um pouco, a possibilidade de abusos.
A remoção de conteúdos idênticos – que acontecerá de forma mais célere – ainda demanda uma ordem do tribunal. Ou seja, não é responsabilidade das plataformas identificar e remover esses conteúdos por conta própria, explicou Massaro.
Outra limitação está no artigo 1º, que limita o escopo da resolução à desinformação que atente contra a integridade do processo eleitoral, o que deixaria de fora ataques contra a honra de candidatos, avaliou Carlos Affonso de Souza, diretor do ITS Rio, em fio no Twitter.
ESCALADA
Com a resolução aprovada nesta quinta-feira, a tendência é de uma nova escalada nas tensões entre a Justiça Eleitoral e aliados e apoiadores do presidente Jair Bolsonaro, os quais consideram a corte uma antagonista.
A resolução amplia os poderes do TSE e a concede autonomia para atuar junto às redes sociais sem necessidade de provocação por partido ou candidato - atuando fora do que seria o escopo usual da Justiça Eleitoral.
Isso pode alimentar narrativas bolsonaristas que se desenham desde o início do período eleitoral – ainda mais notadamente nesta última semana – de que o TSE estaria censurando vozes da direita.
"A narrativa já é de censura e é muito difícil de se contra-argumentar, porque isso exige que você explique todo o aspecto jurídico envolvido na discussão sobre censura e liberdade de expressão para convencer a outra pessoa de que não se trata de censura, e sim de uma ação legítima do TSE", disse João Victor Archegas, advogado e pesquisador do ITS-Rio.
Por outro lado, a inação também não parece ser uma alternativa viável para o TSE.
"O tribunal está desempenhando seu papel e está tentando fazer com que o seu combate à desinformação seja o mais eficiente o possível considerando todas essas questões que vimos nas últimas semanas", disse o advogado.
Considerando a situação na qual a gente se encontra, não fazer nada não é uma opção.
- João Victor Archegas, do ITS-Rio
O encontro dessas tensões destaca o quão delicado é o momento atual para a Justiça Eleitoral. A saída pela qual a corte optou sugere que:
- as ações implementadas junto às plataformas e a própria ação das empresas até o momento não foram suficientes para conter a desinformação, cuja propagação se agravou especialmente na campanha para o segundo turno;
- as competências usuais da Justiça Eleitoral não a capacitam suficientemente para liderar o combate à desinformação. Por isso foi necessário trazer essa resolução que temporariamente amplie seus poderes para que ela possa atuar de maneira mais efetiva.