O comércio de cigarros eletrônicos está a todo vapor no Facebook e no Instagram e no WhatsApp, apesar de a Meta ter restringido esse tipo de anúncio em 2019. A compra e venda desses dispositivos também rola solta em grupos de WhatsApp em várias regiões do Brasil.
Propagandas de vape também são proibidas aqui no país desde 2009, bem como a importação, comercialização e marketing desses produtos. Mesmo assim, o uso dos DEF's vem aumentando no país devido a estratégias inteligentes da indústria e lobby do tabaco.
Uma das maiores preocupações entre médicos e cientistas é o crescimento do uso entre adolescentes. Recentemente, até um ministro do governo Lula foi flagrado ao vivo durante uma reunião pitando um USB.
É ✷ importante ✷ porque...
O Facebook, Instagram e o Whatsapp estão entre as redes sociais mais usadas do Brasil, com dezenas de milhões de usuários
Mesmo com restrições da Meta em 2019 e com propaganda proibida no Brasil, comércio e marketing online de vapes e pods persiste
O comércio e propaganda desses dispositivos de fumo é bastante focado em jovens

VAP3S E POODS
Não é difícil encontrar conteúdos que violem as políticas da Meta e a regulação do país, incluindo a popular estratégia de alterar do nome do produto para burlar o filtro que o Face tem para a palavra vape.
Qualquer busca similar que brinque com as letras dos nomes do produto possibilita encontrar facilmente dezenas de anúncios. Na biblioteca de anúncios do Facebook, por exemplo, o Núcleo conseguiu achar várias propagandas ativas utilizando o termo Vap3 e Vaper.
Os anúncios eram em sua maioria, de adegas e tabacarias, que vem sendo os maiores alvos recentes das forças de segurança.
A tática funciona para outros termos, como os Pods, que são uma versão menor e mais barata dos Vapes (esses últimos costumam ter mais autonomia e em geral são recarregáveis). No Marketplace ambos são facilmente encontrados às dezenas colocando mais letras "O" na busca por Pods, por exemplo.


Vem pro Zap
Para além dos anúncios e vendas diretas, no Facebook e no Instagram foi possível observar a tática de levar os interessados para o WhatsaApp, usado por 92%
dos brasileiros. Um dos grupos visitados pelo Núcleo tinha mais de 850 participantes.

O que diz a Meta?
A reportagem mandou vários questionamentos à Meta:
Perguntas do Núcleo
1 - Em 2019, o Facebook e o Instagram atualizaram sua política para restringir conteúdos relacionados a álcool, tabaco e DEF´s. Desde então, houve atualização, seja para afrouxar ou não, essa política? Podem detalhar?
2 - Que tipo de trabalho tem sido feito pela Meta atualmente para restringir esse tipo de conteúdo no Brasil?
3- No caso da moderação desse tipo de conteúdo, ela é feita de forma automatizada ou por moderadores? Por que tantas brechas foram encontradas pela reportagem?
4 - Foi possível encontrar venda de vapes tanto no marketplace quanto em anúncios ativos no Facebook. Que tipo de moderação é feita nesses espaços que permite essa aparente brecha nas políticas da Meta?
5 - No caso do Instagram, foram encontrados alguns perfis de vendas indiretas, no qual o interessado entra em contato via whatsapp com o vendedor. Perfis assim violam as diretrizes da Meta?
6 - As restrições que a Meta fez a tais conteúdos no Instagram e Facebook em 2019 valem igualmente para o Whatsapp, incluindo o Business?
Resposta da Meta
A empresa respondeu parcialmente aos questionamentos e enviou ao Núcleo a nota abaixo:
“Proibimos anúncios que promovam a venda ou o uso de produtos de tabaco ou nicotina e de equipamentos relacionados. Os anúncios não devem promover dispositivos de vaporização como cigarros eletrônicos, vaporizadores ou outros produtos que simulem o fumo. Usamos uma combinação de denúncias da nossa comunidade, tecnologia e revisão humana para aplicar nossas políticas, removendo conteúdos violadores. Recomendamos que as pessoas denunciem quaisquer conteúdos que acreditem ir contra as Diretrizes da Comunidade do Instagram e os Padrões de Publicidade da Meta através do próprio aplicativo”.
Sobre o WhatsApp, a Meta diz que não é permitido uso do seu serviço para fins ilícitos ou que instigue ou encoraje condutas que sejam ilícitas ou inadequadas, mas não informou como pretende combater ou fiscalizar o comércio dos produtos.
A empresa disse ainda que "usuários podem enviar denúncias para o email [email protected], detalhando o ocorrido com o máximo de informações possível e até anexando uma captura de tela."
Posição da Anvisa
A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) informou que há dois mecanismos para combater esse tipo de comércio eletrônico.
O primeiro é um sistema automatizado de busca de anúncios irregulares de produtos sujeitos à Vigilância Sanitária, por palavras chave, com as cinco maiores plataformas de venda de produtos pela internet.
Ao Núcleo, a Anvisa informou que "nos últimos 12 meses foram retirados mais de 18.800
endereços eletrônicos que divulgavam e/ou comercializavam produtos fumígenos irregularmente na internet".
Deste total, mais de 60%
das propagandas estavam relacionadas a cigarros eletrônicos e cerca de 10 mil
anúncios irregulares estavam nas redes da Meta, que recebeu pedidos de remoção diretamente da Anvisa.
E o que dizem especialistas?
Para a coordenadora do Projeto Controle do Tabaco da ACT Promoção da Saúde, Mariana Pinho, o atual panorama do marketing online de cigarros eletrônicos é preocupante principalmente porque os usuários das redes sociais tendem a ser jovens.
Segundo Pinho, a última Pesquisa Nacional de Saúde, de 2019, mostrou que 70% dos usuários de vape tinham entre 15-24 anos e a maioria não fumava cigarro industrializado.
"Diferentemente daquilo que propagam as empresas desses produtos de que eles seriam direcionados ao público adulto fumante quem está consumindo mais frequentemente são justamente os jovens que nunca fumaram. E a promoção nas redes sociais contribui muito pra disseminação disso".
A preocupação da pesquisadora faz sentido, já que, de acordo com dados do TIC Kids Online Brasil 2022, 86% dos usuários de 9 a 17 anos reportaram possuir um perfil em uma rede social (96% para os usuários de 15 a 17 anos).
E, dentre as plataformas investigadas, as redes da Meta dominam em usuários: o WhatsApp lidera com 78%, seguido pelo Instagram com 64%. O Facebook veem em quarto, com 47%.
Graziele Grilo, coordenadora sênior do programa de pesquisa e líder regional do Institute for Global Tobacco Control (IGTC) para a América Latina, reforçou ao Núcleo que o marketing não vem se focado nas pessoas que estão tentando parar de fumar, mas sim nos jovens, que estão cada vez mais atraídos pelo uso de cigarros eletrônicos.
A pesquisadora citou dados da pesquisa Covitel 2023, que expôs que 30%
dos jovens que usaram cigarros eletrônicos compraram o produto pela Internet.
Questionados onde viram essas propagandas de DEF's, 33%
dos entrevistados relataram ter visto publicidade de cigarros eletrônicos na Internet ou nas redes sociais e, dentre as motivações, 32%
dos entrevistados que admitiram o uso do produto citaram a curiosidade e o fato dos cigarros eletrônicos estarem na moda como motivação para compra.
Devido a esse panorama, Grilo defende monitoramento abrangente da publicidade e do comércio eletrônico.
"Essas redes sociais abriram portas para a venda de produtos por meio de conversas diretas com os consumidores e aumentaram a exposição dos produtos por meio de de conteúdos promocionais velados em publicações nas redes sociais".